terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Comentário de Sandra F às traduções disponíveis do poema de E. Bishop, "One Art", disponíveis online

(links para as traduções aparecem da primeira vez que os tradutores são mencionados)


Embora americana, Elizabeth Bishop é uma escritora de grande importância no Brasil devido aos  vinte anos que lá viveu e à influência da cultura brasileira em muitos dos seus poemas, contos e cartas. Sendo assim, não será própriamente surpreendente que as traduções do poema “One Art” disponíveis na língua portugesa sejam provenientes de tradutores brasileiros.

As três propostas disponíveis na internet (Horácio Costa, Paulo Henriques Britto, Nelson Ascher),e também publicadas, são todas elas feitas em português do Brasil, embora a de Paulo Henriques Britto seja de longe a mais conhecida e considerada por muitos como a mais coerente entre todas.
É também, na minha opinião, a que mais apresenta um portugês brasileiro com o uso da palavra “mamãe”, “pouquinho” e o “você”. Denota-se  por parte de Paulo Britto e de Nelson Ascher uma preocupação por manter a rima  do texto de partida enquanto que Horácio Costa aparenta evidenciar o aspecto rítmico do mesmo.

Parece-me importante realçar o que os três tradutores retiraram da expressão “hard to master”.
Sendo uma das expressões chave do poema de Bishop, não é motivo de admiração que cada tradutor tenha optado por um ideal diferente que influencia inclusivamente todo o poema.
Horácio Costa olhou para a expressão como “não tarda  aprender”, o que nos faz olhar para o sentimento de perda como algo inevitável e para todo o resto do poema como se este fosse uma espécie de bloco de notas com pequenos passos de preparação para essa realidade.

Contráriamente a esta proposta, Paulo Britto remete-nos para a ideia de que “a arte de perder não é nenhum mistério”.Tudo o que demais se lê no poema são acontecimentos que reforçam a ideia de que já conhecemos esse sentimento, tornando o poema um pouco mais intimista, a meu ver.
Nelson Ashcer traduziu como “é facil de estudar” numa primeira fase, mudando ao longo do poema como se este realmente fosse um acto de aprendizagem contínua para a qual o poema nos remete.

Outro aspecto no qual os três tradutores divergem encontra-se nos primeiros dois versos da quarta quadra. Paulo Britto é o único a usar uma exclamação – “AH!” - e muda um pouco o sentido da frase do texto original ao escolher introduzir a ideia de lembrança das coisas que o sujeito poético perdeu, de forma a articulá-la com a ideia de que o acto de perder não é nenhum mistério.

Os outros dois tradutores escolheram traduzir sem exclamações, mantendo a frase fluida embora Nelson Ascher traduza “houses” como lar e “isn't hard to master” como “é fácil de apurar”, de maneira a corroborar a ideia de domínio do acto de perder, como anteriormente foi referido.

Como é fácil concluir desta pequena análise e comparação, embora sejam todos tradutores provenientes do mesmo país e traduzam para a mesma língua,  as escolhas são bastante diferentes tanto em termos de vocabulário usado como em escolhas de tradução e relevância:
Horácio Costa utiliza uma linguagem mais cuidada, dá mais importância ao ritmo mantendo as rimas e as frases curtas enquanto tenta dar a ideia da perda como um sentimento inevitável;
Paulo Britto pretende dar mais ênfase ao ideal do poema e descura na ideia de rima e diverge mesmo em algum vocabulário de forma a torná-lo mais intimista;
Nelson Ascher mantém tanto a rima como a linguagem cuidada mas enfatiza bastante o acto de perder como algo que se domina com o tempo.
Três opções que tentam retratar, cada uma com a sua perspectiva da noção e do acto de perda, o ideal escrito por Elizabeth Bishop.

Um comentário:

  1. Li apenas a tradução de Nelson Ascher. Eu não posso encontrar um adjetivo publicável para o meu choque ao ver One Art completamente desfigurado. Para uma pessoa que leu muita poesia nos dois idiomas, a tradução de Ascher é uma excrescência malcheirosa. Contudo, concordo com a escolha de Ascher pela rima. One Art é um vilanelle, portanto, requer rima no refrão. O maior pecado da tradução de Ascher nem é a forma. O pior é que parece que ele não entendeu bem o poema. Sei, rimar um verbo com um substantivo em português é complicado, mas pode-se escolher um verbo da mesma conjugação. Eu precisaria de uns 20 anos para traduzir One Art, mas assim sem pensar muito, eu começaria,
    A arte de perder não é dura de ganhar; tantas coisas parecem cheias do desejo de se perder que a perda nem vai te matar.
    Outras coisas me incomodam ainda mais. Ele traduz fluster como deixa estar ou coisa assim. Fluster é estar pasmado, não é deixar barato e se conformar (seria, no verso, o pasmo das chaves perdidas). Por isso evito ler traduções de brasileiros. Sloppy.

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